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sexta-feira, 31 de março de 2017

crise de valores


 Um homem deu parte do seu fígado à sua filha. Para isso ausentou-se do trabalho para realizar a intervenção cirúrgica. Quando regressou tinha uma carta de despedimento. Nela, a sua entidade patronal dizia que assim teria mais tempo para cuidar da sua prole. A matriz primária do ser humano contínua intacta, mesmo que mergulhados em pleno século XXI.

 Mais do que uma crise económica vivemos uma gravíssima crise de valores. Não é difícil perceber isto. Basta estarmos atentos a esta chafarica. E estarmos atentos ao nosso dia-a-dia. Ao que se passa em nosso redor. Nunca uma sociedade viveu tão informada, tão indignada, mas e o resultado disso? Sabem?

Se por um lado estamos informados, por outro a velocidade com que as noticias nos caem ao colo leva a que passemos de indignação para indignação sem grande atenção ou profundidade.

Um homem perdeu o emprego para dar vida à sua filha. Indignamo-nos. Logo de seguida chega um atentado. Indignamo-nos. Depois chega mais um resgate a um banco onde temos conta e temos medo, indignamo-nos. Isto no prazo de um dia. A indignação da sociedade poderia levar a algumas mudanças, mas já nem indignarmo-nos conseguimos fazê-lo com reflexos, com propósito. E depois precisamos de aligeirar a vida. Basta um busto mal atamancado e a coisa faz soltar o riso. Eu também me ri. Aquilo está feio como tudo. Mas depois penso que foi um rapaz desempregado que o fez em 15 dias. Há aqui um certo mérito. Ou um desmérito que me apela aos sentidos. Lembram-se de uma escultura que o Cavaco Silva inaugurou algures a meio da A1 e que foi um balúrdio? E é um pilarete, ao alto, que quando bate o sol temos de colocar os óculos de sol para não nos encadearmos e enfiarmos o carro na traseira de um camião. Não houve grande indignação. E já agora que falamos no Cavaco Silva, se ele escrevesse um livro de memórias patrocinado pelos mesmos que patrocinaram o do Sampaio? Ui, imagino a indignação que seria. Assim foi só uma mini-indigação.

Saltamos de indignação em indignação com a leveza com que mudamos de roupa. Daqui a uns tempos não me lembrarei mais deste pai que, em Espanha, país pertencente a esta europa dos valores (cof cof), foi despedido. Terei outra indignação. Ou mais duas. Ou três. Que descartarei sem problema.

Falam da crise económica, mas vivemos uma outra bem mais grave e perniciosa. A dos sentidos e dos valores.

quinta-feira, 30 de março de 2017

dia 30 de março 2017




Se me pudessem ver daí para aqui, viam-me perfeitamente encolhida, livro sobre o peito, computador sobre as pernas e estas encolhidas porque sustêm a minha filha que adormeceu. Estamos as duas no sofá, semi encolhidas e eu mal respiro para não a acordar. Tenho uma panela com água, sal e azeite ao lume à espera de receber uma massa. E deve borbulhar à espera que eu faça alguma coisa, mas estou encolhida e não me mexo para a minha filha não acordar. Ouço daqui a água a saltar. Mantenho-me aqui de pernas encolhidas. Há pouco, quando lia Aulas de Literatura de Julio Cortázar, passava as páginas com uma calma sem precedentes, sem barulho, numa suavidade que até me permitia ouvir o bater do meu coração. Tirei o som ao telefone. Tirei o som à TV. Se tivesse música em casa, apenas se ouviria um Tom Waits, nada mais. E a respiração dela pesada e a minha o mais leve possível para não a acordar. A agua a borbulhar ouve-se aqui, na sala.

Tenho tanto para vos contar! Ontem comprei este livro de que vos falei e hoje trabalhei cada segundo com ele na cabeça. Queria ter a possibilidade de em vez de ter ido para o trabalho ter feito um desvio para um canto e consumi-lo com gana. Este é um livro oral, baseado nas aulas que Cortazar deu em 1980 numa universidade Americana. Então, sendo a transcrição das suas aulas, primeiro quis ouvir a sua voz numa entrevista que deu e que está no youtube; depois, munida do seu tom, do seu timbre, comecei a ler e a magia deu-se: parece que ele está no meu ouvido a dar-me as aulas sobre o que é um conto, o que é um romance, o amor que tinha por Borges (quem não tem?) e de como no seu tempo de jovem ainda não sabia que a missão de um escritor ‘ que é além disso um homem, tinha de ir muito para lá do mero comentário ou da mera simpatia dos grupos combatentes’, ele refere-se à política mundial. Penso que hoje a coisa também deveria ser assim…

Ontem fui fazer um workshop de risoto. É uma luta, percebem? A primeira vez que comi estava em Itália na minha Florença. Não gostei. Tinha ido com uma amiga. nessa noite ela declarou-se. nem sempre o amor é belo, às vezes é incomodo. desconfortável. não desejado. Demorei a voltar a tentar comer risoto. A segunda vez, foi num pequeno restaurante à parte de baixo da minha antiga casa, adorei. ficou 1-1 no marcador. E foi sempre assim: oscilar entre gostar e detestar. Quis ir à luta. Foi ontem, entre uma boa conversa com a minha amiga T e um bom vinhinho, sinto que ganhei vantagem. Percebem? O problema é que ele exige tempo e paciência. Na verdade o tempo mede-se facilmente: 16 minutos. A paciência não se mede: ou se tem ou não se tem.

Receio que a água evapore e eu fique aqui, cheia de cãibras para que a minha Maria não acorde e a panela queime. Se assim for, paciência. 
o meu risoto de cogumelos e espargos

O raio do livro é caro para caramba, mas vale a pena.

segunda-feira, 27 de março de 2017

Aquárius é mais do que um filme


 
O filme começa com uma festa em que uma senhora, tia da protagonista, faz 70 anos. A família está reunida na sala e os miúdos mais novos prepararam um discurso em honra da tia e começam a debita-lo. A tia, uma mulher de cabelos prateados, bonita, serena, olha para todos comovida com o que vai ouvindo. De repente pousa os olhos numa cómoda e nesse preciso momento recorda-se do minete que o seu companheiro, o amor da sua vida lhe fez, exatamente com ela em cima dessa cómoda. Esse móvel, que podia ser um outro objeto qualquer, é como que um objeto que rompe com o tempo, que carrega memória. Nessa cena, vê-se uma mulher ainda nova, um homem, e toda a arte do amor atinge a tela. De barulho de fundo está a voz dos miúdos a tecerem os elogios à tia que vai sorrindo à medida que o seu cérebro lhe devolve o sexo, o prazer. É assim que começa o filme Aquarius, um filme brasileiro que conta com Sónia Braga no principal papel.

A sala de cinema estava cheia e eu era a mais nova. O filme deve fazer parte de alguma brochura com sugestões de lazer para seniores. Ao meu lado uma senhora com cerca de 70 anos que, na cena de abertura, encostou-se de tal forma que a minha cadeira abanou. Percebo… é sempre bom sabermos que a geração dos nossos pais e avós também fizeram exatamente aquilo que nós achamos que só nos fazemos. Que só nós é que somos loucos e libertos e sem tabus… tretas.

O filme mostra uma Sónia Braga de 65 anos, com todas as rugas a que tem direito e ainda uma certa beleza, viúva, com três filhos, a viver o que lhe resta da vida entre um bom vinho, um charro e a sua família e amigos numa casa que sempre foi a sua casa. Aqui reside o problema, já todos os vizinhos venderam os respetivos apartamentos para que fosse construído, no lugar, um belíssimo terreno frente à praia, um empreendimento de luxo. Mas Sónia Braga (Clara no filme), não lhe interessa o dinheiro, aquelas paredes testemunharam o crescimento dos filhos, a relação com o seu marido, a sua luta contra o cancro da mama,  e como tal resiste. O que é que este filme tem de tão especial? Tudo. Para além de nos mostrar que a vida não acaba quando atingimos determinada idade (é sempre bom sabermos disso), que há sentimentos e vontades que acompanham a nossa time-line. Mas se me perguntarem que cena levei para casa, não foi o sexo desenfreado, não, nem o facto de me rever numa mulher que ouve musica enquanto bebe um bom vinho (coisa que faço amiúde), mas a cena em que ela engata um viúvo algures numa festa. Vão para o carro e começam a beijar-se. Ele coloca a mão sobre o peito dela e ela, docemente e sem tabus, diz que teve cancro e que tinha tirado esse peito e tenta colocar a mão no outro. Ele, nesse momento, de forma educada mas tensa, retrai-se. Percebe-se que esmorece e, cobardemente, diz: ‘você é uma mulher muito interessante, mas preciso levá-la a casa’. Ele não aguenta lidar com uma mulher mastectomizada. Não tem mais tusa. Ela não lhe interessa mais. Ela sorri com um certo sarcasmo e apanha um táxi para casa, sozinha. Chega a casa e vê-se a cómoda, sempre a cómoda e todos os seus lp’s (ela foi jornalista musical) e a música de Maria Betânia a entoar no filme e em nós. Abre uma garrafa de vinho e deita num copo, põe uma música e dança, dança para ela, para a vida, para nós.

Há filmes que só se permite não se ver se não soubermos que existem. Deste já vos dei conta.



quinta-feira, 23 de março de 2017

vamos parar o mundo?



Daqui não se percebe mas quando tirei esta fotografia estava num restaurante pequeno, quente, com uns belíssimos quadros de gente gordinha e feliz e comer. Foi aqui que comi o melhor risotto e bebi um vinho branco floral com calma e preceito. Não fiz contas à vida que a vida tem-me trocado as voltas, apenas parei o mundo. Parei o meu mundo. Fiquei em silêncio a olhar o céu azul típico das noites frias. Se calhar o segredo para se seguir em frente é este: não olhar para trás. Não fazer contas. Não esperar resultados. Parar o mundo. Parar.


terça-feira, 21 de março de 2017

das separações.






Estou em Amesterdão e o pai da minha filha (ainda não consigo chama-lo de ex-marido) está em Espanha. Perguntam-me com frequência: com quem ficou a tua filha? Por norma, como ando bem-disposta, respondo que lhe deixei 5€ por cada dia e ela desenrasca-se muito bem. Mas depois reflito e penso que as pessoas equivocam-se muitas vezes sobre os limites do que é uma família. A família é a mãe, é o pai, os irmãos, os avós, os amigos… não percebo a dúvida. Depois pensam que com uma separação tudo muda. Muda muita coisa, mas o amor não pode mudar. De cada vez que digo que falei com a minha sogra ou que a minha sogra ficou com a miúda, sinto olhares incrédulos sobre mim. Mas eu não sei como poderia ser de outra forma. Quando me separei tinha de deixar de gostar de pessoas de que sempre gostei? Como é que isso se faz? É automático? É um botão? E porquê fazê-lo? Como é que isso se procede? Um dia gostamos de uma pessoa e no dia seguinte passa-se a detestar todos os membros de uma determinada família? Como é? Tudo o que se viveu vai para o esgoto? Não, não me explique que eu não quero saber!

Nunca conheci os meus avós e a minha mãe sempre esteve dedicada aos filhos numa presença constante. As férias eram com a minha tia Palmira. E quando a minha mãe tinha coisas para fazer ficava com a senhora Emília, uma mulher que vivia no fundo da nossa rua e que tinha duas filhas. Ficava lá com o mesmo à vontade com que ficaria em minha casa. A sociedade é uma rede que podemos saber tecer melhor ou pior, e que serve de apoio, de estrutura. Esta era a minha rede, a da minha filha é outra, bem mais densa.

Tento estar o mais presente possível na vida da minha filha. O pai tenta o mesmo. Mas quando não conseguimos e às vezes não conseguimos simultaneamente, tenho, logo em primeira instância, a minha querida sogra (dizem que sogra é sempre sogra e eu fico muito feliz) que é a melhor avó que a Maria podia ter. Sei que tudo faz e desfaz pela neta. Está sempre presente, sempre. Como se agradece a uma pessoa que aprendeu a mexer no whatsapp e a esta altura já me mandou imensas fotografias da Maria de hoje de manhã? Sei como dormiu e o que comeu. Sei as piadas que ela diz. As brincadeiras que tem. E ouve-me atentamente quando lhe digo que acho que a Maria está a precisar disto ou daquilo. Não tinha de ser uma excecional sogra para a adorar, bastava ser a avó que é, mas tenho a felicidade de ser também uma sogra como não conheço nenhuma outra; e tenho a minha cunhada (curiosamente é para a minha filha aquilo que sinto que sou para a minha sobrinha), a Áua, um  misto de ama, amiga e avó da Maria, a minha querida Catarina que já ficou com a Maria em conjunto com as suas duas filhas (há amigos que se transformam rapidamente em família) e que me perguntou se a queria deixar lá em casa, e se necessário fosse, vinha a minha mãe com as suas couves e bacalhau do norte para cuidar da neta. Ou até o meu irmão, que lá tinha de se levantar mais cedo para levar a sobrinha à escola.

Quando as pessoas se separaram, e atenção que eu sei pouco sobre este tema, apenas tento fazer o caminho o melhor que sei e o melhor que posso, é de salutar que as crianças sintam o seu meio o menos beliscado possível. Basta a separação parental. Se a essa juntarmos a separação total da família e dos amigos (aqui dava pano para mangas… e aqueles amigos que desaparecem de repente? Aqueles que acham que têm de tomar uma posição sendo que a única plausível era não tomarem nenhuma e que depois puf, cadê?) o mundo como o conheceram até então desaparece e com ele a estabilidade de que precisam.

Por isso, as almas atormentadas que estão preocupadas com quem deixei eu a minha criatura preferida, ela está bem e recomenda-se. Como se está quando estamos com quem nos ama acima de tudo.

A Maria com um chapéu que a avó lhe deu

Amesterdão



 Estou em Amesterdão. No meu caminho diário do hotel para o café deparo-me com o fim deste canal. De certa forma isto fascina-me. A água chega aqui e pára. Não vai para mais lado nenhum. Queda-se como se já não tivesse mais vontade. Não quer ir mais além. A sua vida é esta. Hoje estava com umas cores particularmente dramáticas o que adensa a trama. Para onde iria se quisesse? Para onde iria se a deixassem ir?


sexta-feira, 17 de março de 2017

da arte... uma seca, não leiam.



 No corredor da casa dos meus pais há uns quadros com umas rosas. Não são especialmente bonitos. Não são especialmente feios. São rosas pintadas e com uma breve inscrição que, imaginem, nunca li. Não sei como ficaria aquele corredor sem aquelas rosas. Era a única coisa que havia na casa dos meus pais. Nunca houve, lá em casa, grande ligação com a arte. Na verdade nunca tive nenhuma. Meus pais viviam preocupados com outras coisas. Em Trás-os-Montes nos anos 70 e 80 era acima de tudo difícil a sobrevivência, quanto mais pensar-se na arte. Creio que já estaria em lisboa a primeira vez que fui a uma exposição, ou pelo menos a primeira vez que uma exposição me disse alguma coisa. Ainda era uma gaiata e entrei no Museu de Arte Antiga e aquilo falou-me aos berros. Entrou em mim escancarando todas as portas. Fascina-me a arte, certa arte, Não toda, apenas aquela com a qual tenho uma ligação. Aquela que me cutuca. Que Bule com os sentidos. Aquela que me aparece em sonhos. Que não deslarga.

Lembro bem a primeira vez que vi um quadro do Francisco Vidal e a promessa que me fiz de um dia tê-lo especado numa parede de minha casa. Ou daquela vez que vi uma litografia numa casa em Santos e olhando para o preço tive vontade de vender o meu carro para comprar aquela mulher desfigurada mas com saias aos corações que me olhava de uma montra.

Quando engravidei o meu obstetra tinha no seu consultório um quadro de Paula Rego. Era uma mulher desfigurada que me olhava sempre que me deitava e abria as pernas. Ele via como eu estava e eu não largava o olhar da monstra que de certa forma me dava colo. Era um momento estranho mas sinto saudades dela.

Acontece isto, deparar-me com determinada arte e quase querer casar e morrer de amor com ela.

Há coisa de meio ano botei os olhos, sei lá eu como, nuns pratos pintados de Rita Wainer, uma artista brasileira, e quis ter um na minha sala. Quis tanto. Quero tanto. Mas ela é brasuca e eu sou portuga e funcionária publica. Não é só um oceano que nos separa é também a minha carteira.

Não sei se é por viver a fase de vida que estou a viver mas de quando em vez vou ao seu site ver o que ela pinta, coloco a imagem grande, imagino na minha sala e descanso olhando para aquelas mulheres de cabelos negros com frases que me dizem algo, muito, tudo.

Aguardo que esta vontade passe. Ou talvez não.

Encontro na arte muitas das respostas que procuro diariamente.








quarta-feira, 15 de março de 2017

O pai da minha Maria


O dia do pai está à porta e este ano ele cutuca-me de forma distinta. Não penso tanto no meu querido pai, mas no pai da minha Maria. A Maria tem um pai que é muito diferente de mim e ao ser diferente de mim e ao sermos ambos os pais da Maria, ela tem uma realidade e uma vivência muito rica. Ambos a queremos acima de tudo e para ambos ela é a nossa prioridade. Por ela, deixamos de lado o que nos diferencia e tentamos acordos. Temos conversas diárias. Gastamos o telemóvel com imagem e vídeos para mandar ao outro na tentativa que o outro sofra menos na ausência. Porque doi. Doi muito quando a sabemos com o outro sem que possamos estar a ver o que está a fazer. E tentamos diminuir essa dor, esse enjeito, essa amargura. Mais belo ainda - é por causa dela que ainda rimos em conjunto.

A Maria tem um pai e o pai da Maria é o melhor pai que ela podia ter. Aqui há tempos perguntavam-me se eu algum dia me arrependi deste pai para esta Maria. Nem respondi por achar a pergunta tão descabida. Foi como se me perguntassem se eu acho que há limoeiros em Marte. A Maria só existe porque há este pai e se voltasse atrás era com ele que teria esta Maria. Não se muda a mãe e não se muda o pai. Ela tem tiques dele. É tão clara quanto ele. Cabelo liso como o dele. Com um gosto musical especial como ele tem. Até sardas a miúda já tem. A minha Maria não seria esta minha Maria se não tivesse este pai. E este pai foi, talvez, a única coisa que escolhi bem na vida. Porque escolhemos. Na maioria das vezes escolhemos ter filhos com este ou aquele homem. E  depois, muitas vezes, desdizemos de tal façanha. Como se ter um filho fosse coisa pouca. Fosse uma loucura no meio de uma paixão. Ter um filho deve ser pensado, ponderado para depois, mesmo depois da conjugalidade, que se pode desfazer na espuma dos dias, haja a paternidade que nos une.

Quando ouço mães a falarem mal dos pais às próprias crianças, penso que as estão a martirizar por uma escolha que apenas às mães diz (disse) respeito. Há maus pais? Sim, há. Há pais que depois de uma separação se esquecem dos filhos, sim há. Mas julga uma mãe que a criança não sabe disso sem que lhe seja preciso dizer? Sabe, pois. A criança sabe exatamente que tipo de pai é o seu pai. Não precisa do rancor da mãe em cima das palavras para lhe fazer ver que aquela pessoa está aquém do que gostaria. Não podemos amar os filhos, dizer que queremos o seu melhor e depois desdizer do pai. Eu sei bem os defeitos do meu pai. Não foi a minha mãe que os disse. Fui eu que fui descobrindo. Detestaria ouvir minha mãe falar mal do meu pai. Sei bem os desfeitos do pai da Maria (e este saberá dos meus). E sei que o pai da Maria nunca falará mal de mim. Se discordamos pegamos no telefone e falamos. Às vezes gritamos. Discutimos. Desligamos com vontade de matar o outro. Dá vontade de dizer: o teu pai isto ou o teu pai aquilo. E depois? Que tipo de mãe seria se o fizesse? O que ganharia a Maria com isso? Mesmo quando ele faz diferente do que eu gostaria, não está ele a fazer o seu melhor? Não estou eu a fazer o meu melhor quando faço diferente dele?

Há maus pais, que há, mas há mães que podiam refletir mais e melhor quando falam com os filhos.

Que sirva para isso este Dia do Pai que se aproxima.